RETROSPECTO
Depois de todos aqueles anos de
solidão criara para si uma rotina segura, sem grandes emoções.
Já não pensava em amores que a
fizeram passar noites sem claro, há muito não molhava o travesseiro de
lágrimas, há tempos deixara de sofrer de amor, enquanto procurava outro sentido
para continuar vivendo.
Num domingo chuvoso e melancólico o
celular tocou de maneira nova. Eram toques rápidos e ninguém dizia nada. E na
telinha viu mensagens e o número de um celular.
“Estou com saudade de você. Vamos
tomar uma garrafa de vinho para esquentar esse dia molhado e escuro?”
Curiosa, e já pensando em amar outra vez, ligou para o número que estava na tela. E uma voz impessoal disse: “Coloque o código
de longa distancia, depois o seu código e o número do telefone”
Mas como se ela não sabia quem era
quanto o código!
Desistiu. Esqueceu.
No dia seguinte o toque ligeiro, a
tela escrita. E todos os dias ela
recebia uma mensagem carinhosa: “eu te amo, por que você não responde?”
“Hoje é dia dos namorados, vamos
sair para nos amar”.
E no dia dos amigos: “nem como amigo
você me quer?”
Depois de tantos anos, alguém ainda
sentia saudade dela! Queria recomeçar um namoro! Mas quem? Pensou já
entusiasmada, já cheia de esperança.
Os dias passavam e as mensagens continuaram. Ela pouco a pouco
sentia seu coração renovado, cheio de esperança, e a curiosidade aumentando.
As conjecturas tomaram conta de sua
mente. Será o Eduardo? Não. Ele não diria essas coisas amorosas. Falaria sobre
sexo, e como ela era gostosa.
E o Elcio? Talvez ele fosse capaz de
dizer que ainda lhe amava. Mas, ela sabia que ele estava bem feliz, casado com
uma jovem que tem a idade da sua filha.
E o João? Ele não faria esse
mistério. Diria logo seu nome e a que veio.
Talvez fosse seu irmão ou primo fazendo gozação, chegou a pensar.
Mais tarde, o misterioso fã,
insistiu para que ela dissesse o sobrenome dele.
Ela. Com medo de parecer ridícula,
arriscou escrever o nome de seu grande
amor. Acertou.
E a mulher voltou a sonhar. Visitou
o salão de beleza, pintou os cabelos, tratou dos pés e das mãos, comprou roupas
novas, sapatos e bolsas combinando.
Sentia-se mais jovem. Voltou a sonhar e esperar.
Esperou muito, teve crises de
ansiedade e seu coração sofreu até o homem marcar
o primeiro encontro.
Ela
tremula de emoção entrou no carro, jurando para si mesma que não o
amava mais, seria apenas uma diversão
sem compromisso.
Ele muito magro e sem dentes.
Tirou todos os antigos, velhos e
amarelos, para implantar nova dentadura. Suas nádegas eram secas e cheias de
pelanca.
Ela parecia mais jovem, mais cuidada.
Mesmo assim, para ele, foi diversão
Para ela, o renascimento de um amor,
que só a fez sofrer outra vez.